sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Pedro Calado e a aposta desportiva do Município


Manter o Funchal
na rota dos grandes eventos

Numa altura em que o Funchal festeja os 500 anos de elevação a cidade, o Vereador do Desporto, Pedro Calado, assume o desafio de manter a Capital madeirense como palco de alguns dos grandes eventos internacionais. A nível interno, a política manter-se-á na melhoria das infra-estruturas existentes.


Roberto Paulo Pereira (textos)
no Especial Cidade do Funchal

— Em que “pilares” tem assentado a política desportiva do Município do Funchal?
— O ano de 2008 tem sido algo diferente dos anteriores, uma vez que todo o apoio, direccionado para a área do Desporto, concentrou-se na empresa “Funchal 500 anos” — responsável pelas comemorações do V centenário de elevação a Cidade. Dotámos esta empresa de todo o apoio logístico e financeiro, para que fosse criada uma série de eventos que se constituíssem como uma mais-valia para a Região e para a Cidade do Funchal. Entendemos que faria todo o sentido tirarmos partido de todas as infra-estruturas que o Governo Regional foi construindo, e bem, ao longo dos últimos anos. Dessa forma, potenciámos aquilo que a Região tem de melhor para oferecer. Na minha opinião, não chega estarmos representados em Feiras de Turismo, nem realizar campanhas publicitárias. Temos é que conseguir trazer os próprios desportistas à Região, fazendo passar por aqui os grandes eventos, para que possam aferir “in loco” todas as condições que temos para oferecer. O “feed-back” tem sido positivo pelo que considero que foi uma aposta ganha. A nível de política interna, colocámos em “stand-by” aquela que vinha sendo a nossa aposta de proceder aos melhoramentos das infra-estruturas já existentes, uma vez que os nossos recursos financeiros não são ilimitados. Em 2009, vamos voltar a dar prioridade a esta matéria. Temos vários complexos desportivos espalhados pelo Concelho, sendo que já nos candidatámos a um projecto de fundos comunitários, no sentido de dotar todas as infra-estruturas que temos no Concelho de boas condições.

Leia toda a entrevista na nossa edição impressa.

Marítimo conclui estágio em Melgaço com equipa por definir


Quatro sistemas tácticos
em quatro jogos


Uma vitória e três empates. Eis o saldo do conjunto de jogos que o Marítimo realizou na última semana em Melgaço, local que acolheu parte da pré-época pelo sexto ano consecutivo. Um período importante, conforme reconheceu Lori Sandri, para o técnico definir o modelo e a estratégia a adoptar, depois dos problemas sentidos na Venezuela. Mas ainda há muita coisa por acertar.

Leia mais na nossa edição impressa.

Opinião: Gustavo Pires







Os Jogos, as Medalhas
e o Desenvolvimento

As medalhas podem dar muita satisfação à generalidade da população, podem ainda dar mais satisfação aos atletas, aos técnicos e aos políticos; contudo, elas, só por si, nada representam em termos de desenvolvimento do desporto e do país.

Os Jogos Olímpicos arrancaram. São o maior espectáculo à escala do Planeta, por isso, todos os países do mundo sem excepção, têm os olhos postos nos seus atletas. Mas não só, porque ao terem os olhos postos nos atletas também sonham com as medalhas que, eventualmente, eles podem ganhar. Por isso, as previsões são o mais natural. Desde que o homem se conhece a si próprio faz previsões a fim de tentar controlar o futuro. Foi o que o Comité Olímpico de Portugal (COP) fez, no início da preparação para Pequim, num protocolo assinado com o Instituto do Desporto de Portugal, comprometendo-se a ganhar cinco medalhas. Entretanto, em vésperas de partir para Pequim, ouvimos o Presidente do COP anunciar uma expectativa de «onze medalhas menos uma», por afastamento de Sérgio Paulino. O país está delirante e os políticos ainda mais. Não há nada melhor do que um bom par de medalhas olímpicas para, momentaneamente, tirar o país da depressão em que se encontra e dar aos portugueses o ilusório sentimento de que temos um sistema desportivo digno de um país desenvolvido. Contudo, num trabalho de Daniel K. N. Johnson da Universidade do Colorado-USA, de acordo com um modelo económico utilizado na investigação, Portugal não aparece na lista dos países ganhadores tal como não aparece Cuba que em Atenas ganhou 27 medalhas (9,7,11). Entretanto, numa estimativa baseada em critérios meramente desportivos, de acordo com “Sports Facts & Figures Guide - For the Media”, Portugal ganha 4 medalhas (1,2,1). Quer dizer, os países podem ganhar medalhas olímpicas e, depois, proporcionarem às suas gentes um desporto e uma qualidade de vida deficientes.
As medalhas podem dar muita satisfação à generalidade da população, podem ainda dar mais satisfação aos atletas, aos técnicos e aos políticos; contudo, elas, só por si, nada representam em termos de desenvolvimento do desporto e do país. Numa determinada perspectiva até representam o estado de subdesenvolvimento do desporto e do país. De facto, ganhar 4, 5, 10 ou 11 medalhas, quando a generalidade dos jovens está arredada da prática desportiva, na medida em que o país apresenta a mais baixa taxa de participação desportiva da Europa, não é um sinal de desenvolvimento mas de subdesenvolvimento. Quando o investe praticamente todos os recursos disponíveis na preparação de atletas porque a obtenção de medalhas é o objectivo primeiro de todas as políticas públicas e não a consequência, o Estado está a desperdiçar recursos, a contribuir para criar ainda mais assimetrias no país e a iludir o próprio desenvolvimento.
O desenvolvimento em matéria de desporto é uma questão de equilíbrio entre a base de praticantes e a elite. A não ser assim, o desporto torna-se num instrumento de alienação que, no fundo, mais dia, menos dia, se volta contra os próprios desportistas. Não há nada mais degradante em termos de dignidade humana do que ver antigos campeões a reivindicarem os apoios a que têm direito, a agradecerem as migalhas que caiem das lautas mesas dos senhores dirigentes, ou a venderem-se miseravelmente na televisão a anunciarem a Margarina Casqueiro.
Portugal pode ganhar 4, 5 ou até 10 medalhas. Em termos de desenvolvimento significa o mesmo que não ganhar nenhuma na medida em que, depois, não existem políticas de promoção do desporto direccionadas para tirarem partido do “efeito de campeão”. Em consequência, sem pôr minimamente em causa o mérito dos atletas e dos treinadores, as medalhas até acabam eventualmente por ser prejudiciais ao desenvolvimento, já que, no frenesim da obtenção de resultados, os políticos ignorantes e os dirigentes oportunistas, acabam por apostar tudo no rendimento, na medida, nos recordes, no espectáculo e no profissionalismo de Estado em prejuízo da generalização da prática desportiva. Precisamente como na antiga União Soviética ao tempo do estalinismo mais duro, quando a promoção da prática desportiva entre a população, ao contrário daquilo que diziam as estatísticas oficiais, era pura e simplesmente inexistente, porque o Estado dirigia os recursos para os resultados nas grandes competições, a fim de promover e perpetuar o regime. O regime entre nós é outro, mas os objectivos parecem ser semelhantes.
Infelizmente em Portugal está-se a ir no mesmo sentido. Não existem políticas públicas minimamente credíveis de promoção do desporto. O Estado limita-se a despejar anualmente no Movimento Desportivo muitos milhões de euros que, depois, controla de uma forma deficiente. São dinheiros públicos, provenientes das famílias portuguesas, pelo que deviam ser objecto de divulgação pública. Já lá vão muitos anos desde a última vez que foi divulgado um relatório acerca da maneira como estão a ser gastos os dinheiros públicos no desporto. É tempo do COP esclarecer esta questão. Num país do grupo dos desenvolvidos como é Portugal, por cada atleta presente nos Jogos Olímpicos devia haver, pelo menos, 100 mil a praticarem regularmente desporto. Até porque, pelos próprios estatutos, compete ao COP «promover o gosto pela prática desportiva como meio de formação do carácter…» e segundo a Carta Olímpica «a prática desportiva é um direito humano». Ora, com uma deficiente cifra de 23% de praticantes desportivos, Portugal não está a cumprir aquele direito fundamental, por muitas medalhas olímpicas que possa ganhar em Pequim.

Opinião: JM Silva







A Série Madeira

Duma certeza estamos imbuídos, a de que muito lucrará o futebol regional com tal série, cuja discussão não está a ser nada pacífica. Tudo porque alguns dirigentes desportivos, tendo vivido durante muito tempo sem dificuldades financeiras, se vêem agora confrontados com outra realidade, que os assusta…

JM Silva

Já lá vão muitos anos que se assistiu na Madeira a uma enorme revolução no seu futebol regional, então pujante com a realização de três campeonatos, o da primeira, o da segunda e o da terceira divisões, para além dos torneios de Reservas e de Segundas Categorias entre os clubes mais representativos.
Hoje, falar-se desses tempos áureos do futebol regional é algo difícil e mesmo complicado, porque sobretudo a grande maioria dos dirigentes dessa altura já não fazem parte do mundo dos vivos e ainda porque muitos dos jovens de igual período e que nada tinham a ver com as dificuldades com que viviam os seus clubes de bairro, desconhecendo em absoluto a autêntica “ginástica” que tinham que desenvolver os seus dirigentes, também esses jovens de então vão rareando.
Contudo, apesar dos fracos recursos ao seu dispor, época após época com descidas de uns e subidas de outros, todos os campeonatos se realizavam sempre com o mesmo número de clubes em cada divisão.
E, apesar de se tratarem de competições regionais, o público tinha por elas uma grande paixão e os recintos onde os jogos se realizavam apresentavam-se normalmente com boas molduras humanas e, quando acontecia qualquer derbi regional, era dia de arraial.

Então, e em termos de infra-estruturas desportivas, para a prática do futebol, elas eram em número deveras exíguo, uma autêntica penúria sendo então o pelado do Liceu de Jaime Moniz o principal palco de jogos para todos os escalões, realizando-se em todos os fins-de-semana encontros de futebol para todos os gostos, de manhã até à noite, de tal jeito que, se alguém disso se tivesse lembrado na altura, aquele recinto de há muito teria lugar cativo no famoso Guiness Book (o livro dos recordes).
Outro recinto que desde os primórdios do desporto-rei entre nós, infelizmente hoje desactivado, o Campo do Almirante Reis, foi por assim dizer o berço onde nasceram os primeiros grandes jogadores madeirenses, que volvidos alguns anos conquistavam para o seu clube, o CS Marítimo e para a Madeira, o título de Campeão de Portugal e onde também se jogava o sol a sol, transformando-se num extraordinário viveiro de jogadores.
No Funchal, para além destes dois recintos, havia a sala de visitas do nosso futebol, o ainda Estádio dos Barreiros, onde apenas tinham acesso os quatro maiores clubes madeirenses de então, o CS Marítimo, o CF União, o CD Nacional e o Sporting CM, este esporadicamente substituído pelo CF Carvalheiro, popular colectividade do Monte.
Na Choupana e no Palheiro Ferreiro situavam-se outros dois “pelados”, obviamente com menos utilização por se situarem em zonas já algo afastadas da baixa funchalense.

Situando-nos no tempo em que muitos conterrâneos nossos viviam em concelhos rurais distantes do Funchal, onde a água e a luz ainda não haviam chegado a milhentos lares madeirenses, onde havia gente que nunca tinha vindo à Cidade, quando para chegar-se ao Porto Moniz se levava uma eternidade, facilmente se compreende que também o futebol não chegava a tais paragens, situando-se então e preferencialmente no Funchal numa enorme percentagem e os restantes nas então freguesias mais próximas da capital, Santa Cruz, Machico e Câmara de Lobos.
Por mor deste situação, aliada à gritante escassez de recintos onde os atletas dos muitos clubes se pudessem treinar com um mínimo de condições, é normal que o futebol estivesse pouco desenvolvido em relação a outras regiões do País.
Acresce que numa época em que se vivia de mãos dadas com o compadrio, dirigentes de clubes que não tivessem compadres nos locais de decisão raramente conseguiam mais do que umas escassas horas em cada época para treinamento das suas equipas.
Por todo o sítio onde houvesse uns metros quadrados de terreno alcatroado ou cimentado, nos adros dalgumas igrejas, numas escapadelas aos “ervados” na Avenida do Mar, etc. tudo era aproveitado para uns curtos exercícios físicos onde raramente havia a presença de qualquer bola. Era difícil mas sobretudo doloroso trabalhar-se em semelhantes condições, mas nem por isso se deixava de trabalhar.
Por tudo isto é natural que não sintamos saudades desses tempos difíceis, mas algo de bom ficou desde sempre enraizado em nós: o amor à camisola que orgulhosamente envergávamos e o respeito e a admiração que nutríamos pelos dirigentes de então que não se poupavam a esforços e até sacrifícios para que os seus clubes subsistissem e neles pudessem muitos jovens praticar a sua modalidades mais querida, o futebol.

Com a conquista da autonomia após a revolução do 25 de Abril, lenta mas progressivamente, a Madeira foi obtendo as suas primeiras conquistas, e a determinada altura, entre outras coisas mais, foi ver-se as diversas Câmaras espalhadas pela ilha a receberem periodicamente do Governo Regional as verbas possíveis para que o poder local iniciasse um desenvolvimento a todos os níveis em cada localidade.
E entre as mais variadas deliberações dessas edilidades achou-se como medida acertada dar apoio ao clube ou aos clubes da sua jurisdição em prol da sua juventude.
Porém, diferente era dar-se apoio a um, dois ou mesmo três colectividades do que fazê-lo em relação a duas dezenas ou mais como era o caso da Câmara Municipal do Funchal, em cuja área de jurisdição estavam sedeados 90% dos clubes regionais de então.
Seria essa disparidade que, paradoxalmente, foi matando o futebol regional, tudo porque os dirigentes dos clubes sedeados fora do Funchal, a quem algures apelidámos de novos ricos, olhando mais para o seu ego do que preocupando-se com a juventude das suas zonas, deram início a uma nova forma de reforçar os seus planteis, batendo as portas dos melhores valores que militavam nos clubes funchalenses, aliciando-os com o vil metal facilmente entrado nos cofres dos seus clubes.
Foi, digamos, uma emigração em massa que naturalmente acabou por inviabilizar a continuidade dos clubes da capital, cuja Câmara não pode acudir a tantos “filhos” em pé de igualdade com as restantes espalhadas pela ilha.

Entretanto, enquanto iam sendo riscados do naipe de colectividades regionais, clubes como o Sporting CM, o Carvalheiro, o Académico, o Barreirense, o Recreio e Desporto, o Lazareto, o Alma Lusa, o Pilar, o Monte Real, o Real Vitória, o Coruja, a União Desportiva de Santo António, o Pátria e o São João entre outros que porventura nos tenham escapado, aqueles clubes que passaram a ser apoiados pelas autarquias foram vencendo ano após ano o Campeonato Regional da I Divisão e por mor dessas conquistas ingressando na III Divisão Nacional, enfraquecendo naturalmente o futebol regional.
A experiência dalguns clubes a nível nacional revelar-se-ia amarga para o São Vicente, que despromovido acabou abandonando o futebol sénior, para o 1.º de Maio por razões que tiveram a ver com a corrupção desportiva, para o Santacruzense que voltando aos regionais de lá não conseguiu ainda sair e ainda para o Estrela da Calheta que após ter descido da III Divisão Nacional esteve inactivo no futebol sénior ao qual regressou há pouco tempo.

No passado dia 3 de Julho, o Governo Regional decidiu que «a partir da época 2009/2010 deixará de financiar nos termos actuais a III Divisão Nacional (de futebol) sem prejuízo de um período de transição financeira, a determinar, incentivando assim a criação de uma Série Madeira». Esta notícia, ou se preferirem intenção do Executivo madeirense, caiu que nem uma bomba, sobretudo no seio de quantos clubes que participam ainda na III Divisão Nacional e que de momento desconhecem os subsídios a receber num futuro próximo.
Tendo vivido largos anos sem dificuldades financeiras de alguma monta e vendo-se agora numa situação diferente, para pior, do que aquela a que estejam preocupados com o futuro próximo dos seus clubes.
Sobre os moldes a implementar para que a Série Madeira venha a ser uma realidade, temos as nossas ideias, mas não as vamos aqui revelar porque essa decisão pertence única e exclusivamente aos clubes envolvidos nessa questão que, pelo que tem vindo a lume, de pacífica não tem nada.
Duma certeza estamos porém imbuídos, a de que muito lucrará o futebol regional com tal série.
Primeiro porque por toda a ilha, que se percorre agora em muito menos tempo, existem modelares infra-estruturas desportivas para a prática do futebol, graças à politica governativa para o efeito, segundo porque renasceria o espírito bairrista de anos idos fazendo de cada jogo uma festa, terceiro e talvez o capítulo mais importante, movimentaria mais atletas nados e criados na nossa Região Autónoma.

PS: Este apontamento foi elaborado terça-feira, 12-08-2008, antes da Assembleia Geral dos Clubes que iriam decidir sobre o sim ou o não da Série Madeira.

Opinião: Manuel Sérgio







Spiridon Louis
— o primeiro herói olímpico

Na alma dos gregos que viveram esses momentos inolvidáveis, as duas maratonas (a antiga e a moderna) confundiam-se, agitavam-se na palpitação dos grandes sentimentos humanos.


Ia disputar-se a prova da Maratona, nos primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna. O pensador francês Michel Bréal batera-se pela integração desta disciplina, no quadro olímpico. E com êxito, tanto mais que na Grécia a consideravam como directa emanação do seu patriotismo multissecular. Diz a lenda que um mensageiro grego teria galgado, em desaustinada correria, os 42 quilómetros que separam a planície da Maratona da cidade de Atenas (corria o ano 490 ª C.) para anunciar a vitória dos seus compatriotas sobre os invasores persas. E, transmitida a boa nova, teria sucumbido, morto de emoção e de cansaço...
Pois, verdade ou não, o certo é que, no dia 10 de Abril de 1896, vinte e cinco atletas se apresentaram à partida, para esta prova, precisamente na planície da Maratona. Em redor, uma paisagem de claridade forte realça o sentimento de festa popular, pelo renascimento dos Jogos Olímpicos. Entre os concorrentes, um pastor grego que dava pelo nome de Spiridon Louys. Cumpria o serviço militar e fora o seu comandante de companhia, o coronel Papadiamantopoulos, que o indicara como maratonista de invulgares recursos. Mais alto que baixo, enxuto de carnes, olhos quase infantis, ninguém dava nada por aquele provinciano habituado ao silêncio e ao ar finíssimo da montanha. Mas acreditava nele o coronel Papadiamantopoulos que, montando um garboso cavalo, o seguia de perto – presença estimulante e reconfortante!
Batiam as 14 horas, quando a Maratona se iniciou. Colado aos atletas, Papadiamantopoulos acompanha nervosamente o desenrolar da corrida. Logo de entrada, o australiano Edwin Flack, que já conquistara o primeiro lugar nos 1500 metros, em passada larga e poderosa, afastou-se dos demais concorrentes e chegou, a dada altura, a obter nítida vantagem – nada mais, nada menos do que 1000 metros aproximadamente! Ao trigésimo quilómetro, no entanto, ainda no primeiro lugar, arrastava-se extenuado pela estrada poeirenta. De qualquer forma, através de ciclistas que iam e vinham, numa roda-viva, espalhara-se pelo estádio que Spiridon vinha atrasado, em relação ao australiano, e pelas bancadas rolavam insultos desabridos, ironias corrosivas, denúncias vilíssimas à figura de Papadiamantopoulos. Onde fora ele descobrir aquele pastor magrizala e assustadiço?... Não andaria o coronel a brincar com o prestígio da sua Pátria?
Entretanto, ao trigésimo quinto quilómetro, Edwin, de faces golpeadas pelo sofrimento, era forçado a desistir. Agora, à frente de Spiridon, seguiam o americano Blake e o francês Lermusiaux e, mesmo estes, a curta distância. Spiridon refresca-se com uma bebida e ei-lo, num desdobramento surpreendente de agilidade, empertigado, a palmilhar metro após metro, como se a prova houvera começado naquele instante. Ultrapassa, em cadência forte, Blake e Lermusiaux. E, ao 37º quilómetro, já ele corria triunfante, a caminho da meta. Papadiamantopoulos, fora de si, num entusiasmo inexaurível, esporeia o cavalo em direcção ao estádio, sobe ao camarote real e de pupilas relampejantes e a voz embargada pela comoção, exclama: «Majestades, Spiridon está em primeiro lugar e deve ganhar a Maratona!» A família real pulou nas cadeiras como se mola de aço a jogasse ao ar. A novidade alastrou com prontidão e uniu, em fervor patriótico, todos os espectadores.
Quando Spiridon assomou à boca do túnel, em primeiro lugar e distanciado dos demais concorrentes, o estádio positivamente endoideceu e os príncipes Jorge Constantino abandonaram o camarote e desceram à pista, acompanhando (com o panache das belas atitudes) o campeão, nos últimos metros da prova. Na alma dos gregos que viveram esses momentos inolvidáveis, as duas maratonas (a antiga e a moderna) confundiam-se, agitavam-se na palpitação dos grandes sentimentos humanos. Com uma ágil corrida, que os quilómetros sucessivos não cansaram, Spiridon Louys fora assim o grande herói dos primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna.

Opinião: Vinhais Guedes







Aos seus lugares,
prontos, partida!

Muito embora a representação portuguesa ultrapasse as sete dezenas de atletas, muitos deles fizeram apenas os mínimos necessários à participação nos jogos, pelo que não é de esperar, como já vem sendo hábito, a obtenção de muitas medalhas.


No momento em que este jornal chegar aos leitores, terão passado já mais de 8 dias da inauguração dos Jogos Olímpicos de Pequim. É bem possível que, durante estes últimos dias, tenha havido soluções para alguns dos problemas que aqui enuncio, especialmente no que respeita às dificuldades levantadas pela organização à comunicação social internacional.
É verdade que o ano de 2008 não tem sido favorável para a República Popular da China (RPC) que, neste ano de olimpíadas, sofreu catástrofes naturais, com milhares de mortos. Mas, apesar da aparente adversidade dos deuses, a grande feira do espectáculo desportivo mundial pouco ou nada será afectada no seu esplendor
Ultrapassadas as dificuldades, a RPC prepara-se para colher os frutos do grande acontecimento que há anos perseguia. É porventura o mais eficaz instrumento de afirmação de uma grande potência emergente, com crescimentos económicos “assustadores” para o mundo desenvolvido.
Se, por um lado, a organização destes jogos tem uma face de extrema importância geoestratégica e um potencial político e económico únicos, tem também custos e riscos com os quais a RPC tem de contar. O aumento da poluição atmosférica existente em Pequim, o delicado problema dos direitos humanos, as questões do Tibete e outras, nomeadamente aquando do transporte da chama olímpica, junta-se-lhes agora um dos maiores, que vem levantar suspeitas na atribuição dos jogos àquele país.
Os direitos e liberdades concedidos à imprensa internacional constituem, porventura, o mais grave de todos quantos têm de enfrentar. As últimas notícias são uma autêntica reviravolta nesta matéria, tendo, inclusivamente, surpreendido o presidente do Comité Olímpico Internacional, Jacques Rogge, que garantiu recentemente que o governo chinês iria conceder liberdade à imprensa estrangeira na cobertura dos jogos, acrescentando que os mesmos poderiam fazer reportagens livremente e transmissão de imagens, não havendo, sequer, censura na Internet.
No entanto, as últimas notícias apontam no sentido contrário, referindo que o acesso a determinados sites de conteúdo mais delicado foi proibido pelo governo chinês. Isto apesar de a RPC ter antes garantido não aplicar a lei chinesa que impede o acesso sem restrições à Internet no país durante os jogos.
Independentemente de outros desenvolvimentos relacionados com as liberdades, direitos e garantias do povo chinês, ou de qualquer outra nuvem negra que paire sobre Pequim, o mundo assistiu a uma grandiosa cerimónia de abertura, porventura, a mais espectacular de todas as edições das Olimpíadas.
O palco foi o estádio conhecido como “O ninho”, obra de um atelier belga. Nesse grande recinto desfilaram cerca de 12.000 atletas, representando mais de 100 países. Convém não esquecer que para alguns deles, o momento de glória é esse mesmo desfile, já que as medalhas não estão ao seu alcance.
Veremos, pois, quem vão ser os mais velozes, os mais fortes, os mais resistentes, em suma, os super-homens e as super-mulheres, os heróis de cada país.
Já se fazem prognósticos do vencedor destes jogos, dizendo-se que a RPC ultrapassará os EUA no número de medalhas, o que será inédito. Contudo, nos Jogos Olímpicos, como no desporto em geral, pode haver resultados prováveis, mas as vitórias só se confirmam após as provas.
E por falar em provas, reafirmo o que já escrevi sobre o que se passa na ginástica desportiva feminina: as atletas não passam de crianças, sujeitas, a partir de tenra idade, a cargas de treinos verdadeiramente desumanos. São crianças com pouco mais de 1,40 metros e não chegam a pesar 40kg!
Continuo sem entender onde estão as organizações defensoras dos direitos das crianças, sempre prontas a condenar o trabalho infantil, mas de olhos fechados e a uma realidade gritante que lhes passa completamente ao lado. Quando se trata de trabalho infantil que permite a sobrevivência dessas crianças existem logo organismos internacionais que defendem os direitos da criança e protestam contra essa situação, enquanto no desporto se aceita tudo, desde que se ganhem medalhas e se oiça o hino do país.
Relativamente ao que se passa na ginástica desportiva feminina, existe já um movimento que defende uma idade mínima para se poder participar nos Jogos Olímpicos e em competições internacionais.
Muito embora a representação portuguesa ultrapasse as sete dezenas de atletas, muitos deles fizeram apenas os mínimos necessários à participação nos jogos, pelo que não é de esperar, como já vem sendo hábito, a obtenção de muitas medalhas. Contudo, os mais optimistas admitem a possibilidade dos nossos atletas trazerem meia dúzia delas. No final se verá.
Já depois de ter escrito este texto, o presidente chinês Hu Jintau veio garantir publicamente as promessas de liberdade e acesso aos sites que um dia antes a China havia negado. Hu Jintau pediu, contudo, uma cobertura objectiva dos jogos, apelando aos jornalistas para respeitarem as leis chinesas. Esta atitude, de um passo à retaguarda, não é mais do que defender a imagem de uma China moderna e aberta ao mundo.
A organização Repórteres sem Fronteiras, que o governo chinês sempre temeu, e a Amnistia Internacional, estão autorizados a aceder a sites considerados sensíveis. Mesmo assim continuarão a existir apertadas restrições de pesquisa.