sexta-feira, 21 de março de 2008

Opinião: "Valeu a pena" — a vida de Moniz Pereira





Manuel Sérgio


Fernando Correia deu uma contribuição bastante válida, para manter em alta aquilo a que alguém chamou, um dia, com rara felicidade, o prazer do texto. Este livro é para ficar, isto é, para ser revisitado inúmeras vezes, na História do Desporto Nacional.


Sendo um “Homem do Desporto”, é para mim sobre o mais uma alma de artista. Daí, o valor, o significado, a grandeza da sua maneira de estar no Desporto. Enganam-se os que pensam que o Desporto se resume a correr e a saltar. Nas actividades ditas físicas, também há inteligência e desejo e amor. A vida de Moniz Pereira, contada por esse mago da palavra (oral e escrita) que é o Fernando Correia, assim o atesta. Desportista entusiasta e lúcido, treinador de indiscutível competência (grande entre os grandes), professor informado e actualizado, compositor e letrista de fados inesquecíveis – Moniz Pereira só podia entender o Desporto como ciência e arte. Neste livro, da autoria de Fernando Correia, intitulado "Moniz Pereira: Valeu a Pena" e editado pela Sete Caminhos, Vasco Lynce declara: «Se me fosse solicitada a educação do nome da figura mais marcante do desporto nacional do século XX, a minha decisão recairia sempre sobre a pessoa do Professor Mário Moniz Pereira.» No mesmo livro, o presidente do Comité Olímpico de Portugal não tergiversa, ao escrever: «Para todos quantos acompanham a evolução do Desporto, o Prof. Mário Moniz Pereira é, e será sempre, um nome incontornável na história do atletismo português.» Encontramos também nesta obra (que deveria ser de leitura obrigatória, nos cursos universitários de desporto) as opiniões do fadista Carlos do Carmo que o considera «um mestre da vida», da escritora Rosa Lobato de Faria que vê nele um dos melhores seres humanos que encontrou na vida e enfim também a minha modesta opinião que o considero um artista-treinador, ou seja, para mim, o Mário Moniz Pereira é o maior treinador da história do atletismo (e não só da história do atletismo português) porque, além do trabalho e do rigor, ao nível da metodologia do treino, há nele a sensibilidade do artista que lhe permite percepcionar, com meridiana clareza, o que de mais profundamente humano há, nas vitórias e nas derrotas, no Desporto.
Conheci, através do Acácio Rosa, o Dr. Salazar Carreira; convivi fraternalmente com o Acácio Rosa; dialoguei com o engenheiro Vasco Pinto de Magalhães, pioneiro do râguebi, no nosso país; fui colega na docência dos Profs. Mário Moniz Pereira, Fernando Ferreira e Noronha Feio; trabalhei sob as ordens de directores-gerais do Desporto, tais como: Armando Rocha, Melo de Carvalho, Rodolfo Begonha, Reis Pinto, Lopes Marques, Mirandela da Costa; julgo ter merecido a amizade de figuras inesquecíveis do desporto brasileiro e espanhol. Conheço alguém, felizmente vivo, que a todos excedeu, na prática e na teoria: Mário Moniz Pereira! Sempre que o comboio da glória passou por ele apanhou-o e desembarcou depois em Lisboa, onde foi alvo de homenagens que qualquer vedeta não desdenharia para si. Mas que mereceu inteiramente. A popularidade e a ressonância dos seus feitos provinham de, digamos assim, muita militância, muita disciplina, muito saber. E também de algo mais que só os génios têm: uma intuição que adivinha e uma inteligência que parece não enganar-se nunca. Como praticante de voleibol, Moniz Pereira foi internacional. Como treinador de atletismo, porém, foi de facto genial. Hoje, com 87 anos de idade, é mais um conselheiro do que um treinador. Com uma cultura desportiva invulgar, para ele devem voltar-se os que pretendem ser treinadores. Ele pode ensinar, nesta especialidade desportiva, como ninguém o poderá fazer, no nosso país. O que é a cultura? É a aliança do saber e da vida. Ora, quem mais viveu (e porque viveu pensou) o Desporto do que o Mário Moniz Pereira? Debrucemo-nos agora sobre o texto de um prosador de eleição, o Fernando Correia, autor deste livro admirável: «Mário Moniz Pereira é um Homem do Desporto, naquilo que há de mais nobre em tal designação. O Desporto como actividade sã, lúdica e lealmente competitiva, a antítese do manobrismo, da viciação, da batota que, aquém e além-fronteiras, tanto têm contribuído para desacreditar um fenómeno que, na sua diversidade, é o mais universal da actualidade. Mário Moniz Pereira é um Homem da Música, talento que menospreza e que, como quem não quer a coisa, martelando no piano, como ele diz, contribuiu até agora com 123 temas, para enriquecer o panorama melódico português (...). O Desporto português jamais saberá quantificar o que deve a Mário Moniz Pereira» (pp. 19/20).
Fernando Correia deu uma contribuição bastante válida, para manter em alta aquilo a que alguém chamou, um dia, com rara felicidade, o prazer do texto. Este livro é para ficar, isto é, para ser revisitado inúmeras vezes, na História do Desporto Nacional.

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