sexta-feira, 28 de março de 2008

Opinião — Manuel Sérgio





“Os Senhores do Futebol”

— um livro de Paulo Catarro


O livro "Os Senhores do Futebol" é escrito, com o rigor do historiador, num estilo agradável, coloquial, que provoca simpatia imediata. Reside, aqui, se não laboro em erro grave, o segredo da sua eterna juventude.


Paulo Catarro é, hoje, um dos mais prestigiados jornalistas portugueses que se ocupam, profissionalmente, do desporto. Desta feita, no entanto, quero saudá-lo como escritor, pois que vem de publicar um livro que dificilmente envelhecerá, intitulado "Os Senhores do Futebol – nos bastidores do desporto rei" (A Esfera dos Livros, Lisboa, 2008). É que este livro reflecte, com fidelidade, uma época do futebol português, precisamente aquela em que Jorge Nuno Pinto da Costa, Valentim Loureiro, Luís Filipe Vieira, Filipe Soares Franco, Gilberto Madaíl, Hermínio Loureiro, Pinto de Sousa, Joaquim Oliveira e poucos mais governaram, de facto, o nosso desporto-rei. A que deve um livro o privilégio de sobreviver a si próprio? Sem dúvida, ao talento do seu autor – o talento que Paulo Catarro vem dissipando prodigamente pelo jornalismo e agora por um livro de índole histórica, concretizando, com elegância, o que aprendeu, na Faculdade de Letras de Lisboa, onde se licenciou em História. Mas o talento não explica tudo. Escritores há que se sacrificam em demasia às modas do seu tempo e, prisioneiros da época em que viveram, morrem fatalmente com ela. Outros há, no entanto, que criam (ou retratam) tipos e caracteres susceptíveis de merecer uma compreensão generalizada, hoje, amanhã e sempre. Está, nesta plêiade, Paulo Catarro. O livro "Os Senhores do Futebol" é escrito, com o rigor do historiador, num estilo agradável, coloquial, que provoca simpatia imediata. Reside, aqui, se não laboro em erro grave, o segredo da sua eterna juventude. O seu autor, com 44 anos de idade e 22 anos de jornalismo, em permanente contacto com os mais influentes dirigentes do futebol português (como a televisão, onde trabalha, no-lo mostra, sem margem para dúvidas), tem as condições ideais para testemunhar o que distingue e condiciona o dirigismo do nosso futebol.
Não, não se trata de um escritor atrevido, picado da tarântula literária; também não escreve de cátedra. Num estilo simples, faz passar por nós um friso opulento de pessoas que, ou resumem as aspirações dos seus clubes e tentam assegurar o seu prestígio, ou são a voz e a bandeira do futebol nacional, no seu conjunto. O objectivo deste livro, segundo o seu autor, procura responder às questões seguintes: «Quem são (no futebol, evidentemente) os Homens Fortes? Quem são aqueles que moldaram as faces do futebol português, tal como hoje o conhecemos? Como chegaram aos cargos de poder que exercem? O que construíram, ao longo da carreira de dirigentes desportivos? Como exercem o Poder?» E acrescenta: «Poderiam estar aqui mais uns ou outros protagonistas. Mas estes foram contudo, na minha opinião, os que marcaram – para o bem e para o mal – o futebol português, nas duas últimas décadas.» Adelino Caldeira, vice-presidente do FC Porto e administrador da Sociedade Anónima Desportiva, que gere o futebol dos dragões, é o primeiro da ordem alfabética em que o livro se desenrola. E surge, nesta obra, com espírito crítico e frases lapidares, para além de uma sólida amizade pelo presidente do seu Clube. Emitiu, em tom solene, a opinião seguinte: «O futebol é o sector português da actividade económica mais competitivo a nível europeu e mundial. O Estado, independentemente da cor política do Governo, tem de tomar uma opção estratégica: o futebol serve para realçar o nome do país e atrair investidores? Ou pelo contrário o futebol não tem interesse nenhum para Portugal? Quando se fizer esta opção, tem de se assumir as responsabilidades e consequências. Se optarmos pela primeira possibilidade, não pode manter-se uma situação fiscal que obriga os jogadores a pagar 42% do IRS mais 11% de Segurança Social, quando em Espanha os estrangeiros, nos primeiros três anos, só pagam 25% da taxa liberatória. Não podem continuar as exigências da Lei das Finanças Locais que impede, na prática, de existir qualquer apoio significativo, por parte das autarquias. Se optarmos pela segunda hipótese, ficaremos todos, os cidadãos portugueses, a ter a perfeita noção de que o futebol não interessa nada ao país.»
Adelino Caldeira surge, diante dos leitores, como um dirigente sabedor e sensato. Andreia Couto, directora executiva da Liga de Clubes de Futebol Profissional, jurista como Adelino Caldeira, parece pessoa diligente, inteligente e de grande serenidade. O prestígio das instituições deve-se quase sempre ao zelo dos que as servem, encarnando o seu espírito, assegurando a sua unidade, definindo as suas funções. Com Andreia Couto a Liga de Clubes de Futebol Profissional encontrou uma directora de boa estatura mental e moral. Está de parabéns Hermínio Loureiro, «um homem do basquetebol», como a si mesmo se designou, e é hoje o presidente da direcção da Liga de Clubes de Futebol Profissional e que, diz Paulo Catarro, «tem como uma das principais missões, e talvez a mais espinhosa, transformar a mentalidade dos dirigentes do futebol nacional» (p. 149). Oxalá o consiga, para que os nossos dirigentes, nas contas que prestam aos sócios e à sociedade, assinalem, não só os resultados financeiros, mas também os ganhos e o crédito no futuro.

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